paulafulini

Sunday, October 12, 2008

Saudade - M. Falabella


Trancar o dedo numa porta dói.
Bater com o queixo no chão dói.
Torcer o tornozelo dói.
Um tapa, um soco, um pontapé, doem.
Dói bater a cabeça na quina da mesa,
dói morder a língua,
dói cólica, cárie e pedra no rim.
Mas o que mais dói é a saudade.
Saudade de um irmão que mora longe.
Saudade de uma cachoeira da infância.
Saudade do gosto de uma fruta que não se encontra mais.

Saudade do amigo imaginário que nunca existiu, saudade de uma cidade, saudade da gente mesmo, que o tempo não perdoa. Doem essas saudades todas.

Mas a saudade mais dolorida é a saudade de quem se ama.
Saudade da pele, do cheiro, dos beijos.
Saudade da presença, e até da ausência consentida.
Você podia ficar na sala e ela no quarto, sem se verem, mas sabiam-se lá.
Você podia ir para o dentista e ela para a trabalho, mas sabiam-se onde.
Você podia ficar o dia sem vê-la, ela o dia sem vê-lo, mas sabiam-se amanhã.
Contudo, qdo o amor de um acaba, ou torna-se menor, ao outro sobra uma saudade que ninguém sabe como deter.
Saudade é basicamente não saber.
Não saber mais se ela continua com o olho inchado quando acorda.
Não saber se ele continua tendo que fazer a barba por causa do trabalho.
Não saber se ele foi na consulta com o dermatologista como prometeu.
Não saber se ela não tem comido bem por causa daquela mania de não comer direito.
Não saber se ela ainda usa aquela calça.
Se ele se matriculou no inglês, se tirou a carta de motorista, se ela aprendeu a entrar na internet e encontrar tudo o que precisa, se ele continua preferindo caipirinha com Sagatiba, se ela continua preferindo coca, se ele continua sorrindo com aqueles olhinhos apertados, se ela continua a passar horas escrevendo, se ele continua cantando no banho, se ela continua assistindo filmes ruins, se ele continua amando, se ela continua tendo amigos estranhos prá caramba.

Saudade é não saber mesmo!
Não saber o que fazer com os dias que ficaram mais compridos, não saber como encontrar tarefas que lhe cessem o pensamento, não saber como frear as lágrimas diante de uma música, não saber como vencer a dor de um silêncio que nada preenche.

Saudade é não querer saber se ela está com outro, e ao mesmo tempo querer.
É não querer saber se ele está feliz, e ao mesmo tempo perguntar a todos amigos por isso...
É não querer saber se ele está mais magro, se ela está mais bela.
Saudade é nunca mais saber de quem se ama, e ainda assim doer.
Saudade é isso que senti enquanto estive escrevendo e o que você, provavelmente está sentindo agora depois que acabou de ler...

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